Por que ainda os homenageamos?

 

Imagem: Creative Commons, de Isabela Muñoz.


Nessa última semana, circulou nas redes sociais um vídeo mostrando indígenas derrubando a estátua do colonizador espanhol Sebastián de Belalcázar na Colômbia.


Essa não é a primeira vez que acontece uma cena como essa. Ainda esse ano nos Estados Unidos, estátuas de Cristóvão Colombo foram derrubadas por manifestantes. Já no Reino Unido, o mesmo ocorreu com a estátua de Edward Colston, traficante britânico de escravos. Na Bélgica, foram depredados os monumentos a Leopoldo II, rei do século XIX responsável pela escravidão e morte milhões de pessoas no continente africano. Além disso, ações semelhantes ocorreram na França e na Itália. 

Esses atos subversivos possuem um contexto muito importante. Todas as estátuas são em homenagem a indivíduos diretamente relacionados ao colonialismo. E é importante pontuar que, mesmo que o conceito geral de colonialismo englobe a práticas de dominação e subjugação que ocorreram ao longo da história, aqui me refiro especificamente ao colonialismo europeu moderno. 

A colonização moderna geral dos continentes americano, africano e asiático iniciada no século XV pelos europeus, se utilizou de extrema violência para a implementação e manutenção da dominação política e econômica. Além disso, essa dominação também se tornou subjetiva (do imaginário, maneira de fazer conhecimento, entre outras). 

Assim, é necessário entender que enquanto falamos sobre a concepção do "Novo Mundo" com a chegada/invasão dos povos europeus nas Américas, os povos nativos e posteriormente os povos africanos (com o deslocamento forçado para escravidão), experienciaram o fim do mundo, uma vez que isso significou sua desumanização e genocídio (fim de sua cultura, língua e modo de ser). 

Então a pergunta é: Por que homenageamos como heróis e imortalizamos em bronze ou marfim, homens responsáveis pela morte, violação e escravidão de milhões de seres humanos? A dominação subjetiva citada anteriormente também permite ao dominador, nesse caso o colonizador, a detenção da narrativa única dos fatos. E enquanto narrador único, o colonizador vai colocar seus pares como salvadores e impor essa visão ao colonizado. 

O jovem belga Noah, de 14 anos, descendente de congoleses e responsável pela criação de uma petição para a demolição de monumentos em memória de Leopoldo II em Bruxelas, disse à CNN Internacional: “Sinto-me muito menosprezado, porque são pessoas da minha origem, meus antepassados que foram mortos por Leopoldo II. Para mim, quando você coloca a estátua de Adolf Hitler em Berlim, é como colocar a estátua de Leopoldo II em Bruxelas”

Noah, por CNN Internacional

A exemplo de Noah e outros manifestantes ao redor do mundo, é necessário entender o significado simbólico dessas estátuas e a potencialidade de ruptura que o ato de as remover possui. Isso não é um apagamento histórico, mas sim a tentativa de inclusão de outras narrativas. Toda história possui diferentes perspectivas e elas precisam ser contadas. 

O processo de colonialismo é central para entendermos o mundo, mas por mais que nos socorramos da historiografia para falar sobre descolonização, a preocupação do debate é com o hoje. Assim, revisitamos o passado para compreender melhor quem somos agora e para termos mais ferramentas para pensar o futuro.
Por: Beatriz Pereira

Referências Bibliográficas
CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre o Colonialismo. Tradução Noémia de Sousa. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, 1º edição, 1978. 
MCLEAN, Scott; SHUKLA, Sebastian. Belgium's King Leopold II has a 21st century nemesis. He's 14 years old. Disponível em: <https://edition.cnn.com/2020/06/25/europe/belgium-king-leopold-statue-petition-colonialism-intl/index.html>. Acesso em 21 de set. de 2020.

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