Teoria da Dependência e o uso de agrotóxicos no Brasil

Imagem: Conexos

Para entender a posição do Brasil como um país agroexportador no Sistema Internacional, é preciso explicar como este foi condicionado a manter a relação Centro-Periferia com a Europa. Nesse caso, será analisado o comércio atual entre o Brasil e a Alemanha, França e Itália, em razão de que estes são os três países que mais exportam na Europa, evidenciando que a transferência de capital ocorre através das trocas comerciais e se assemelham ao período colonial, em que as colônias mandavam todo o lucro para a metrópole. 

Entretanto, nos dias de hoje isso ocorre no comércio internacional de forma mais sutil, onde o Brasil se mantém dependente dos países europeus na importação de tecnologia, inclusive nos agrotóxicos que são utilizados na produção do agronegócio brasileiro. Por isso, essa dependência implica que o país lute pelo seu desenvolvimento de um patamar inferior no comércio internacional, além de que o uso abusivo de agrotóxicos traz problemas irreparáveis ao ecossistema brasileiro, afetando a água e o solo.

O início da história brasileira, é marcada pelo período colonial, cujo objetivo dos portugueses no Brasil, era a extração de metais preciosos. Com o fracasso inicial na busca do ouro, a saída dos portugueses foi iniciar o cultivo extrativista, para obter recursos da colônia. No entanto, a partir século XVII, o tão cobiçado ouro foi encontrado na região das Minas Gerais e após esse período, ocorreu a maior transferência de recursos da colônia para a metrópole.

Posteriormente, a economia que prevaleceu até a década de 1930 do século XX, foi a economia cafeeira. Dado um aumento no consumo de café por parte dos europeus, tornou-se necessário aumentar sua oferta para suprir essa demanda. Assim, como os outros cultivos brasileiros, o produto originado na colônia tinha como destino a Europa, cujas importações se resumiam a máquinas e equipamentos, sendo em sua maioria, destinados ao plantio dos produtos exportados. Como resultado, o Brasil possui estes resquícios do período colonial extrativista até os dias de hoje, que é refletido no comércio internacional.

Posto isto, é possível notar que durante o século XX, a crise do colonialismo foi acentuada no pós-Segunda Guerra Mundial. Com isso, surgem na América Latina algumas ideias que buscam observar o quadro da economia local e das relações com o resto do mundo. Uma dessas teorias foi a do Desenvolvimento, que focava em analisar os impasses que impunham à implementação da modernidade. Foi então que surge a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe), uma organização com o intuito de gerar uma base institucional para o desenvolvimento dos países da região.

Porém, com a crise da Teoria do Desenvolvimento e com o fracasso da reprodução do capitalismo nos países periféricos, surge a Teoria da Dependência em que, conforme Duarte e Graciolli (2007):

"Enxergava que a forma de desenvolvimento implementada na América Latina só tenderia a aprofundar cada vez mais as relações de dependência"
Então a CEPAL foi importante para a América do Sul e Caribe, pois os estudos aplicados pelos teóricos são voltados para o desenvolvimento da região, reconhecendo as limitações históricas que os países nela inseridos passaram. Além disso, do ponto de vista econômico, a Teoria da Dependência enxergava que as relações estruturais de dependência estavam acima das relações mercantis e se moldava no movimento internacional de capitais, via investimentos diretos estrangeiros e no domínio tecnológico.

Agora, vamos fazer uma comparação entre as economias europeias – grandes exportadores de produtos manufaturados e importadores de commodities – com a economia brasileira, exportadora de commodities e importadora de produtos manufaturados. No caso do agronegócio, o Brasil importa agrotóxicos, para depois, exportar insumos alimentícios aos outros países do mundo, os quais boa parte são europeus.

Para entender as relações comerciais entre os países, foi elaborada uma tabela com o valor agregado dos cinco produtos mais exportados de cada país, sendo esses: Brasil, Alemanha, França e Itália. Por fim, foi comparada a natureza de cada produção nacional. De acordo com o site The Observatory of Economic Complexity (2020).



Analisando os dados, é notável que o Brasil tenha um setor do agronegócio muito mais estruturado e ativo do que outros setores, por exemplo, os que demandam maior investimento em tecnologia ou maior aplicação de tecnologia no produto. Esta situação nas trocas comerciais geram uma perda de valor agregado, pois, a quantidade de commodities que o Brasil precisa exportar para comprar bens de capital, é muito mais alta, o que faz com que o país perca nas transações. 

Isso colabora com a deterioração nos termos de troca no comércio internacional. Assim, a teoria pode ser sintetizada, conforme Marçal (2006):
“os países periféricos exportariam bens essencialmente agrícolas e importariam bens industrializados”
Tendo isso em mente, é importante ressaltar que o Ministério da Agricultura aprovou em 2019 o registro de 42 agrotóxicos, totalizando 211 naquele ano. Dentre estes, estão os pesticidas que são de fabricantes como Dow Agrosciences, Bayer e Syngenta. Portanto, esse ponto enfatiza a questão do Brasil possuir a característica de país agroexportador. Pois, os agrotóxicos que são produtos manufaturados, são produzidos nos países desenvolvidos e os fabricantes dos produtos químicos são as indústrias estrangeiras.

Além disso, as leis para o uso de agrotóxicos ainda estão se tornando mais flexíveis e, em suma, o Brasil produz produtos agrícolas com a utilização de agrotóxicos importados, para que boa parte da produção seja destinada para o consumo dos países desenvolvidos, formando um ciclo de dependência na comercialização.

Os efeitos que são gerados pelo uso de agrotóxicos são de longo prazo, cuja água, por exemplo, se contamina por meio da decomposição das substâncias. Assim, com o uso intensivo de substâncias sintéticas (agrotóxicos), é notável o resultado negativo no ecossistema onde os produtos são aplicados. Esta degradação afeta de maneira direta e indireta o solo e a água, tendo em vista que afetam a biodiversidade do ecossistema, dificultando, por exemplo, o crescimento de plantas. Os quais são essenciais para a produção de alimentos, além de impactar na manutenção do bem-estar da população.

Atualmente, em contrapartida com as leis dos países centrais, a legislação brasileira se tornou mais flexível para que seja mantida a relação no comércio internacional, como grande exportador de commodities, resultando no atraso do desenvolvimento brasileiro. Portanto, a agricultura brasileira está submetida ao capital internacional, causando mortes, doenças e infecções, em prol da manutenção do comércio, cujos países periféricos – nesse caso o Brasil – sofrem os impactos causados pelas legislações flexíveis, que autoriza a contaminação da água, a fim de suprir a demanda de alimentos de países desenvolvidos.

Texto: Josueh Regino e André Devecchi
Revisão: Samara Oliveira

Notas
* Este texto é um recorte do artigo "O uso de agrotóxicos no Brasil e os impactos na água: Uma análise teórica cepalina do comércio internacional" submetido para a revista Informe Econômico.

Referências Bibliográficas
BAER, Werner. Economia brasileira. NBL Editora, 2002.
BOMBARDI, Larissa Mies. Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia. São Paulo: FFLCH - USP, 2017. 296 p.
BRASIL. IBAMA. Ranking dos Agrotóxicos. Disponível em: <https://www.gov.br/pt-br>. Acesso em: 26 mai. 2010.
DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub) desenvolvimento na América Latina. V Colóquio Internacional Marx e Engels, Campinas, UNICAMP, 2007.
MARÇAL, Emerson Fernandes. Há realmente uma tendência a deterioração dos termos de troca? Uma análise dos dados brasileiros. Revista Economia, v. 7, n. 2, p. 307-329, 2006.


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