O segundo plano dos protestos na Bielorrússia: O epílogo do último ditador da Europa?

 

Imagem: Sergei Gapon/AFP via Getty Images


No dia 9 de agosto protestos antigoverno eclodiram em Minsk, capital da Bielorrússia, após Alexander Lukashenko anunciar vitória no que a oposição e observadores internacionais consideraram uma eleição fraudada. De acordo com os resultados oficiais divulgados, Lukashenko, que está no poder desde 1994, ganhou com 80,1% dos votos. Após o resultado, mais de 200 mil protestantes, segundo estimativas, se reuniram na capital e foram reprimidos com forte violência policial, onde cerca de 7 mil pessoas foram detidas e ao menos 2 foram mortas.

Nessas eleições, um recorde de 55 grupos se candidataram para as eleições, onde somente 15 tiveram permissão para participar. Os principais nomes da oposição eram Svetlana Tikhanovskaya, Veronika Tsepkalo e Maria Kolesnikova. Tikhanovskaya e Tsepkalo entraram na corrida eleitoral após seus maridos serem proibidos de participar das eleições, caso parecido de Kolesnikova que assumiu a candidatura após o presidencial do qual ela administrava a campanha ser preso.

Antes das Eleições aka Lukashenko se afasta da Rússia

Em 18 de junho, outro opositor de Lukashenko foi preso e posteriormente impedido de concorrer nas eleições. Viktor Babariko, ex-chefe de um banco russo e com ligações com a Gazprom (companhia estatal de energia russa) foi acusado de fazer parte de um conluio orquestrado por Moscou para derrubar o governo. A acusação de envolvimento russo se repetiu também em outros candidatos que foram presos e/ou proibidos de concorrer, incluindo Siarhei Tsikhanouski (esposo de Svetlana Tikhanovskaya) e Valery Tsepkalo (esposo de Veronika Tsepkalo).

No dia 29 de julho, 33 russos, funcionários da empresa Wagner Group, empresa militar privada com ligações com a Rússia, foram presos acusados de envolvimento na tentativa de interferir nas eleições da Bielorrússia. Mesmo com um longo histórico de culpar estrangeiros pelos problemas internos da Bielorrússia, essas acusações em direção a Rússia foram tidas como novidade, visto que ambos os países são historicamente aliados: inclusive possuem um Pacto de Defesa Comum, onde a Moscou prestaria assistência militar a Minsk se necessário.

Essa mudança de direção da propaganda em direção a Moscou veio no mesmo cenário no qual a Rússia começou a exigir preços de mercado para os hidrocarbonetos exportados ao país. Nessa conjuntura, Lukashenko se aproveitou pra tentar obter algum apoio das alas pró-ocidentais antes da eleição enquanto tentava barganhar com o seu maior aliado.

Depois dos protestos aka Lukashenko se inclina para a Rússia

Após as eleições e com o desenvolvimento dos protestos, o quadro político de Lukashenko se torna um contratempo ainda maior. No seu novo cálculo político, a ajuda da Rússia se torna essencial. Meses depois de acusar o Kremlin de desenvolver planos para derrubar seu governo e interferir nas eleições Lukashenko se inclina novamente a Rússia alegando que os tumultos na capital “não eram mais somente uma ameaça para a Bielorrússia”, mas sim para ambos os países. 

Outrossim, Lukashenko muda o inimigo externo dizendo que “a OTAN está em nossos portões” e que a Bielorrússia “morreria como Estado” se novas eleições acontecessem. Na prática, essa gangorra da Bielorrúsia entre a Rússia e o Ocidente fazem parte do jogo político que mantem, no fim das contas, Lukashenko no poder. 

Se as manifestações populares são realmente uma demanda interna da população, os dias do “ultimo ditador da Europa”, como Lukashenko é chamado, podem estar contados. Sem um ator externo para se inclinar Lukashenko perde força, ao passo que o descontentamento da população Bielorrússia aumenta. De fato, a crise econômica e a crise sanitária gerada pela novo Coronavírus, ajudaram a mostrar as rachaduras do governo, e o descontentamento da população, é claro, através dos protestos.

Aparentemente esses conflitos estão circunscritos aos problemas domésticos do país e não há movimentos Pró-Rússia ou Pró-Ocidente surfando a onda da instabilidade política, diferentemente de movimentos democráticos análogos que ocorreram em outras ex-repúblicas socialistas soviéticas como na Ucrânia em 2014 e na Geórgia em 2008.

Todavia, a Bielorrúsia faz parte da zona de influencia do Estado russo e é essencial para esse país por funcionar como uma zona tampão entre a Rússia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) , além de deter importantes dutos que levam hidrocarbonetos russos para a Europa. Isso significa que a Rússia seguirá de perto os acontecimentos do seu vizinho do oeste e tomará medidas se achar que os benefícios prevalecem sobre os riscos.

Por: Thomas Masiero

Referências Bibliográficas
DIXON, Robyn. In tense Belarus, strongman Lukashenko turns back toward Moscow for help. Disponível em: <https://www.washingtonpost.com/world/europe/belarus-protests-lukashenko/2020/08/22/929975ee-e147-11ea-82d8-5e55d47e90ca_story.html>.
HIGGINS, Andrew. Political Grip Shaky, Belarus Leader Blames Longtime Ally: Russia. Disponível em: <https://www.nytimes.com/2020/06/22/world/europe/belarus-lukashenko-russia.html>. 
NOACK, Rick. What’s behind the Belarus protests?. Disponível em: <https://www.washingtonpost.com/world/2020/08/14/whats-behind-belarus-protests/>.

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