Um panorama da economia uruguaia

Imagem: Band Uol 

Atualmente o Uruguai é um dos países mais estáveis politicamente e economicamente da América Latina. Talvez seja o país da região que melhor conseguiu se adequar aos contextos econômicos e políticos do mundo desde sua independência em comparação aos outros. É sabido que os países do nosso continente possuem uma história bastante similar, como se pode observar na obra de Celso Furtado e na coleção “As Relações Internacionais da América Latina” de André Luiz Reis da Silva e Luiz Felipe Viel Moreira. 

Entretanto, parece que as mudanças paradigmáticas e econômicas que atingiram o Brasil e a Argentina, por exemplo, ocorreram de maneira diferente com o Estado uruguaio. Nesse sentido, o objetivo deste texto é tomar algum conhecimento acerca de como ocorreram esses processos dentro do país sob uma perspectiva econômica. Podendo, posteriormente, servir de base para uma análise comparativa da economia uruguaia com a de outros países da América do Sul ou expandir-se para outros aspectos e aprofundamentos das ciências sociais em relação ao país.

A construção deste texto foi baseada na obra “Uruguay: Perfil económico-productivo, desafíos para la transformación social-ecológica” de Sebastián Torres. Por fim, lembra-se que este texto tem um caráter informativo e distante de ser uma pesquisa aprofundada sobre o assunto. A obra de Torres divide a economia uruguaia em ciclos: 
  • período de crescimento para fora (1830-1929); 
  • período de crescimento para dentro (1929-1959); 
  • período liberal (1960-1989) e neoliberal (1990-2005); 
  • período progressista (2005-2019). 
Pelo fato deste texto buscar compreender a econômica uruguaia atual, os três primeiros períodos serão pincelados e o período progressista ganhará maior ênfase.

O período de crescimento para fora (1830-1929) é marcado pela independência do país, herdando uma economia agroexportadora onde o principal setor era a pecuária extensiva. Ao longo deste período, os governos buscaram diversificar um pouco esta característica incentivando a produção de ovinos e o surgimento das primeiras industrias. Este período também marca o crescimento do setor público na economia através dos serviços de água, luz, saneamento, bancos nacionais, ferrovias, usinas e a criação de uma administração para o Porto de Montevideo (responsável pelo escoamento do principal setor da economia da época).

A crise de 1929 gerou uma queda na demanda internacional por produtos primários afetando diretamente o Uruguai, que passou focar em um desenvolvimento para dentro, ou seja, da sua economia interna. Neste período, que compreende 1929 a 1959, foi implantado o modelo de substituição de importações, o qual tinha uma lógica de produzir internamente os produtos que eram importados.

Os excedentes gerados pela economia agroexportadora em conjunto com o incentivo por parte do Estado geraram um aumento importante das industrias no país. Destaque para a diversificação: industrias algodoeira, têxtil, metalúrgica, de grãos, açúcar, papel, carne e borracha. Esta industrialização fez com que a participação da indústria no PIB uruguaio crescesse de forma relevante, porém, muitas destas utilizavam matéria prima importada. O que resultou num desequilíbrio dos intercâmbios comerciais do país, e este modelo passou a se esgotar por falta de insumos, inovação tecnológica e formação de recursos humanos.

Diante da estagnação do modelo de crescimento para dentro, a economia do país passou a adotar as diretrizes liberais: estabilização interna e externa através da liberalização cambiária e do desmantelamento dos controles comerciais. Acompanhada por uma desvalorização significativa do peso uruguaio. Este modelo liberal (1960-1989) foi consolidado pela ditadura implantada em 1973.

O Plano Nacional de Desenvolvimento, posto em prática pelo governo ditatorial, pautava-se pelo crescimento econômico calcado na contração da demanda interna e na redução de salários. O objetivo era incentivar a acumulação de capital e o investimento. O pais também incorreu em uma liberalização financeira e incentivo à exportação através de crédito, exonerações fiscais e diminuição das contribuições patronais. Em paralelo a isso, o Uruguai procurou aumentar suas relações com Argentina e Brasil.

O resultado destas políticas foi um aumento nas exportações e do investimento no país. O setor manufatureiro foi o que mais obteve sucesso. Entretanto, as tentativas de conter a inflação, o aumento da dívida externa e os déficits da balança comercial demonstraram o insucesso interno deste modelo, que levou a uma nova estagnação econômica ao fim da década de 1980.

Durante os anos 1990, o país passou pela tradicionais reformas neoliberais, as quais boa parte da América Latina também sofreu: reforma do estado e abertura comercial. Do ponto de vista macroeconômico, o objetivo foi o combate à inflação. Medidas fiscais e cambiais eram necessárias para isso. Optou-se também pela desregulamentação e retirada da participação do Estado da atividade econômica.

Estas medidas geraram mudanças estruturais na economia uruguaia, resultando numa queda da participação do setor industrial no PIB. Muitas industrias fecharam suas portas, principalmente as menores e as que tinham seu negócio voltado ao setor de exportação. Esta recomposição econômica aumentou os serviços financeiros, o turismo e o comércio.

Ao final da década de 1990, o contexto de crise que viviam os vizinhos platinos do Uruguai, somado ao aumento do preço de matérias primas internacionais e do petróleo, levou a uma queda no PIB uruguaio. A desvalorização da moeda brasileira agravou este cenário, pois provoco uma queda na competitividade comercial do país e desarticulou as políticas cambiarias dos países da região. Isto culminou na pior crise social, econômica e financeira registrada na história do Uruguai.

O período progressista, que marca as últimas década da economia do país, buscou contornar as políticas que causaram o caos social do início dos anos 2000. Neste período houve uma reforma na estrutura econômica do país. A criação de zonas de livre comércios, incentivos tributários e investimentos públicos em ciência e tecnologia são alguns aspectos desta mudança. 

Tendo em vista o viés estrutural das reformas, não se pode atribuir o crescimento uruguaio de forma isolada em uma dimensão. Com isso, é possível dividir essa dimensão em cinco variáveis: 
  1. estrutura do PIB; 
  2. investimento estrangeiro direto; 
  3. exportações e importações; 
  4. empregos, salários e informalidades;
  5. endividamento, consumo privado e gasto público. 
De 1997 a 2016 houve um crescimento da participação de 23 setores no PIB uruguaio, destes, destaca-se o setores de comunicações, extração e industrias de madeira, finanças, seguros, alimentos, bebidas, tabaco, minas e saneamento. Observa-se assim um evolução da economia em seu conjunto.

Diante das transformações corporativas e financeiras ocorridas com a crise 2008 e um aumento da presença chinesa no continente latino-americano, o investimento estrangeiro direto passou a fazer parte de uma média 4,9% do PIB do país. Os setores que ganharam maior ênfase nesses investimentos foram os de compra de terras, imobiliário, indústria de celulose, agropecuário e energias renováveis.

No que se refere ao comércio exterior uruguaio, oito produtos se destacam nas exportações uruguaias: carne bovina, madeira bruta, soja, leite em pó, gado corte, malte e lã. O destino principal destes produtos era a China. A instalação de 11 zonas franca também deram relevância às exportações uruguaias. Em 2003 a participação das zonas francas eram de 3% das exportações, em 2016 este valor subiu para 25%.

Sobre os níveis de emprego, percebe-se um aumento do nível de informalidade apesar do aumento por parte do Estado nos direitos trabalhistas nesta década. Destaca-se nesse sentido, uma maior informalidade no caso das mulheres. As mudanças sociais e culturais ocorridas no país a partir da década de 1990 resultaram num aumento da presença do gênero feminino nos índices de emprego, porém elas ainda representam a maioria dentro dos índices de trabalho não remunerado.

Um possível ponto de alerta é o crescimento da dívida pública do país, chegando a 67% do PIB em 2018. O consumo privado teve seu pico em 2012 e a partir daí tem decaído. E o Gasto Público Social cresceu, o que pode ser, junto com o consumo privado, os principais catalizadores do dinamismo que a economia uruguaia alcançou nesta última década.

Dessa forma, nota-se uma importante modernização das dinâmicas econômicas do país durante o período progressista. Os resultados foram bastante interessantes, porém o crescimento dos índices de informalidade e a desigualdade de gênero do sistema trabalhista do país podem ser pontos a serem avançados. 

Em relação as hipóteses abordadas na introdução, percebe-se que a economia do Uruguai possui uma formação similar a de outros países da América Latina, ainda que com pequenas diferenças. Isto fruto das suas peculiaridades geográficas. Destaca-se, entretanto, que o país ainda permanece mais estável economicamente do que Brasil e Argentina, pois estes países a partir do início da última década davam sinais de recessão econômica, enquanto que o Uruguai permanece com problemas menores para resolver.

Por: Adam Barbosa

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