Mirada nas Eleições: O que é sistema de voto distrital (puro e misto)?

 

Imagem: The Brazilian Report

Não é de hoje que o brasileiro tem desconfiança da política e de seus representantes. Após décadas de escândalos de corrupção, lentidão do Congresso em fazer seu trabalho e desconhecimento da população das funções de cada cargo político, a classe política é vista com cada vez mais descrédito. O principal resultado disso é que vivemos uma “crise de representatividade política”, no qual sentimos existir um abismo entre a sociedade (eleitores) e os representantes políticos (eleitos). 

Isso parece uma contradição, visto que vivemos em um país democrático onde a maioria dos cargos eletivos tem mandatos cíclicos de 4 anos (com exceção dos senadores que tem mandatos de 8 anos). Como é possível termos o poder de mudar os agentes políticos periodicamente, e mesmo assim raramente nos sentirmos representados, em especial, pelo Legislativo? 

Para muitos isso se deve ao nosso sistema eleitoral para os cargos do legislativo (passando do nível municipal até o federal) que gera distorções entre a intenção das escolhas dos eleitores e quem realmente assume os cargos. Explicando melhor: o nosso sistema para as eleições de vereadores, deputados estaduais e federais é o proporcional de lista aberta, que de forma resumida é onde os votos vão ao partido, e depois de calculadas o número de vagas ganhas por cada partido, os candidatos mais votados de cada partido serão eleitos. Parece confuso? Pois de fato é! Um dos pontos polêmicos do nosso sistema é que nem sempre os candidatos mais votados são eleitos e que seu voto pode ajudar a eleger outro candidato. 

Por causa disso existem propostas de alterar o nosso sistema eleitoral, buscando um sistema mais adequado e que faça com que os eleitores realmente se sintam ligados aos seus representantes. A principais propostas envolvem o sistema distrital puro e o sistema distrital misto. 

O sistema distrital ou sistema majoritário, consiste na divisão do território brasileiro em distritos eleitorais com objetivo de representar uma certa parcela da população. Por exemplo, se for aplicado o sistema distrital para as eleições municipais, o território da cidade será dividido em um número de distritos iguais ao de número de vagas para vereadores. Se uma cidade tem 15 vereadores, será dividida em 15 distritos, tendo os candidatos que concorrer a um único distrito e podendo apenas receber votos dos eleitores que moram nesse distrito. Os candidatos eleitos serão sempre os mais votados de cada distrito. 

As vantagens desse sistema é evitar que candidatos poucos votados sejam eleitos, e que cada parte da cidade tenha pelo menos um representante, evitando que certas regiões do município consigam eleger a maioria dos representantes, deixando outros bairros sem vereadores. Outro resultado do sistema distrital, é que os políticos eleitos estão mais próximos da sua base eleitoral, o que possibilita maior fiscalização da população sobre o candidato eleito. Além disso, os custos das eleições se tornam menores, já que cada candidato não vai precisar tentar buscar votos de toda a cidade e focará sua campanha no distrito em que disputa o cargo. 

Já os críticos desse sistema o chamam de “distritão”, apontando que esse sistema dificulta que representantes de grupos minoritários consigam ser eleitos, limita o direito de escolha dos eleitores, que não podem votar em um candidato de outro distrito (um morador da zona rural não poderá votar em um candidato que representa o centro da cidade) e que a delimitação dos distritos abre a possibilidade de manipular os resultados das eleições, podendo ser divididos certos grupos sociais em 2 ou mais distritos, de forma que sempre sejam minorias em cada distrito. Também tem juristas que apontam que esse sistema não poderia ser implementado por ser inconstitucional, pois a Constituição Federal define que as eleições para o legislativo devem ser proporcionais, para que as minorias possam ter representação política. 

Outra possibilidade de sistema eleitoral que tem sido debatida no Congresso Nacional é o sistema distrital misto (que é usado na Alemanha), no qual se combina os dois sistemas anteriores (distrital e proporcional). Nesse caso parte dos candidatos são eleitos pelo sistema distrital e parte pelo sistema proporcional, tendo que o eleitor votar duas vezes. 

Seria uma forma de obter as vantagens dos 2 sistemas: os interesses de cada região seriam representados pelos candidatos distritais escolhidos e, ao mesmo tempo, as minorias e certos interesses políticos específicos (a pauta ambiental e os direitos das mulheres, por exemplo) continuam sendo representadas pelos candidatos eleitos no sistema proporcional. 

O problema é que isso poderia levar ao dobro de representantes no legislativo. A Câmara de Deputados, por exemplo, passaria de 513 deputados para 1.026 membros. Em vez de economizar, o sistema distrital geraria mais gastos na manutenção do Poder Legislativo. Já se for mantido o mesmo número de vagas que existe hoje, o efeito é que os distritos terão que ser muito abrangentes (reduzindo a aproximação da população com os candidatos distritais) e as minorias continuariam a ter menor representação. 

Atualmente existe várias propostas tramitando no Congresso Nacional, sendo que algumas delas são: 
  • O projeto de lei 1.462/2015 (já aprovado no Senado Federal) que propõe o sistema distrital puro para eleições das Câmaras de Vereadores de cidades com mais de 200 mil habitantes; 
  • o projeto de lei 9.212/2017 (também aprovado no Senado e tramitando na Câmara de Deputados) que prevê a adoção do sistema misto; 
  • e o projeto de lei 3708/2019 que busca o sistema distrital puro nas eleições legislativas municipais. 
Entretanto, nenhuma dessas mudanças irá ocorrer nas eleições municipais desse ano, mas se aprovadas no Congresso poderão valer para as eleições de 2022. 

Qualquer mudança no sistema eleitoral precisa ser debatida de forma aprofundada com a população, para que não ocorram mudanças bruscas e confusas para o eleitorado. Temos que refletir se a mudança de sistema necessariamente irá levar a uma melhor representação política, visto que o problema pode não estar na forma que ocorre as eleições, mas sim em outras razões mais profundas e difíceis de corrigir, como a falta de interesse e cultura política dos brasileiros na momento de votar e depois fiscalizar seus candidatos. 

Deixo algumas perguntas para reflexão do leitor(a). Você pensa que o atual sistema eleitoral proporcional é correto, ou acredita que o sistema distrital (seja o puro ou o misto) é uma alternativa melhor? Você se sente representados pelos candidatos que votou nas últimas eleições? E o mais importante: o seu atual candidato a vereador (ou se não decidiu ainda, o candidato que votou em 2016) mora na mesma região do município que você? Caso não more, existe uma grande possibilidade que você não pudesse votar nesse candidato se o sistema distrital fosse implementado no Brasil. 

Por: Alexander Kubiak 

Referências Bibliográficas 
FUCS, José. Como o voto distrital misto pode mudar as eleições no País. Estadão. 28 de setembro de 2019, 17h20. Disponível em: <https://www.estadao.com.br/infograficos/politica,como-o-voto-distrital-misto-pode-mudar-as-eleicoes-no-pais,1039384>. 


TEIXEIRA, Matheus. Para ministro da Justiça, distritão é inconstitucional, mesmo se criado por PEC. Revista Consultor Jurídico. 03 de setembro de 2017, 10h57. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-set-03/ministro-justica-distritao-eleitoral-inconstitucional>.


Comentários